Um preceito de botequim tem uma assertiva que serve tanto
para os relacionamentos amorosos quanto para o futebol: “O problema não é
perder o jogo. O problema é a chacota do torcedor rival”.
Da mesma forma, o
problema não é o corno, a traição propriamente dita, mas a exposição, o
disse-me-disse, enfim, a chacota. Eis que os cornos de Lauro de Freitas, na
Região Metropolitana de Salvador (RMS), resolveram se insurgir contra essa doutrina,
digamos, ultrapassada.
No 8º Café da Manhã da Associação de Cornos do município,
eles não só defenderam a figura do corno manso, como se propuseram a amansar os
cornos que, por pressão social (chacota), estivessem ameaçando fazer alguma
besteira. Leia-se como “besteira” cometer algum tipo de violência contra a
companheira ou contra si mesmo.
“Se a gente souber que o cara bateu ou ameaçou a mulher, a
gente vai lá. Se não resolver na conversa, a gente denuncia”, explica Reginaldo
Sales de Oliveira, 50 anos, um dos fundadores do grupo dos cornos de Lauro.
Casado há 17 anos, Reginaldo, também conhecido como Malhado,
é o tipo corno tricolor. Ele conta que tudo começou quando levou chifre de uma
namorada quando foi assistir a um jogo do Bahia.
“Fui ver Bahia X
Santos em Pituaçu. Quando voltei, a namorada tava pendurada nos beiços de
outro, perto da minha casa. Os caras começaram a fazer hora comigo. Levei na
gozação e ainda criei o grupo”, relembra.
‘Chorei muito’
O atual presidente da associação em Lauro, Antônio Fernando
Correia Filho, 32 anos, talvez seja o mais manso e submisso entre os cornos de
Lauro de Freitas. No bairro de Itinga, é conhecido como “Quero Meu Amor de
Volta”.
Isso porque, há oito
anos, ele procurou um programa de televisão para chorar pela esposa, que acabou
trocando ele por outro. “Chorei muito por ela! Pedi, implorei pra voltar, mas
ela não quis de jeito nenhum”, conta.
Fernando chegou a ir até a passarela que fica em frente ao
Supermercado Maxxi e pensou em se jogar. “Entrei em depressão”, recorda. A
Associação dos Cornos de Lauro de Freitas foi um dos seus alicerces para
retomar a vida, conta Fernando: “Fui orientado pelo pessoal”.
Hoje, o trauma foi superado. Mas, não a ponto de se casar
novamente.
“Ah, isso aí não tive
coragem ainda. Tenho medo de botar a mulher dentro de casa e tomar corno de
novo. Tenho orgulho de dizer que fui corno, mas daí ser novamente é outra
história. Só quero saber de esquema”, declara Fernando.
A Associação dos Cornos de Lauro de Freitas tem 75 cornos
com carteirinha e tudo. A entidade surgiu quando um morador de Lauro ficou
conhecido por levar 13 cornos de 13 mulheres diferentes. A vítima recordista
não compareceu ao café da manhã dessa semana. “Ele tomou tanto corno que ficou
envergonhado”, entregou Malhado.
Projeto de lei
Entre os cornos da associação, tem até um vereador. Amarílio
Topó contou que está elaborando um projeto de lei para que, no dia 23 de julho,
se comemore na cidade o Dia Municipal do Corno.
“Todos os 17 vereadores da cidade são cornos. Mas, só eu
assumo. Espero que pelo menos eles aprovem o projeto”, disse o vereador, que já
foi casado 12 vezes e garante nunca ter flagrado um corno de uma de suas
mulheres.
“Mas sei que tomei corno. Não tem como não ter tomado”,
acredita Amarílio, que tem 45 anos. “Tenho seis filhos e nunca fiz DNA. Melhor
não fazer, né?”, afirmou.
O grupo também é formado por algumas mulheres. São elas que
levam ainda mais consciência ao grupo e amansam os cornos, como faz Albeia
Rodrigues.
“Muitos homens agridem a mulher, matam a mulher. Sou técnica
de enfermagem e já vi muitas mulheres chegando na emergência feridas pelo
marido. Muitos somente imaginavam que tinham tomado corno. Outros tomavam
chumbinho para morrer porque a mulher largou. Isso não existe, gente! O homem
tem que aprender a tomar corno! São muitas mulheres mortas porque o homem não
entende que não é dono da mulher”, ensina Albeia, conhecida como Abelhinha.
Cada corno tem uma história diferente. Mas, todos ali souberam
superar a decepção e valorizar a chacota. “Fui trabalhar. Quando saí, deixei a
cama fria, quando voltei, a cama tava quente”, disse Valdir Assis de Melo, 62,
que conta a história do próprio corno às gargalhadas.
“Perdi, parceiro. O
Ricardão tava lá na hora, em cima da minha cama. Eu olhei e saí. Vou fazer o
quê?”, disse Valdir, que mora no bairro de Areia Branca e era casado há 25
anos.
“Já tô com outra”, avisou. Como a chacota não pode parar,
insistimos: “Mas, já tomou corno da outra?”. “Não, por enquanto parece que tá
fiel”, retrucou Valdir.
“Você que tá dizendo, né!”, brincou o repórter que vos
escreve. Este, aliás, um corno assumido! E para não deixar dúvidas, um “colega”
largou para todo mundo ouvir enquanto posava para a foto desta matéria:
“Jornalista tem tudo cara de corno mesmo!”. *Informações do Correio
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