A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) decidiu
recolher 181 lotes de medicamentos usados para tratamento de hipertensão
arterial devido à presença de impurezas associadas a um potencial risco de câncer.
Entre esses medicamentos, estão o losartana, o segundo
remédio mais vendido do país, e do valsartana, também amplamente usado. Ao
todo, 30 milhões de brasileiros têm diagnóstico de hipertensão arterial.
As medidas, porém, envolvem lotes e empresas específicas e
não abrangem todo o mercado. A lista completa pode ser consultada no site da
agência. Os recolhimentos iniciaram em fevereiro deste ano e seguem
medidas adotadas em outros países.
A agência diz que a iniciativa é preventiva
e nega riscos aos pacientes. A orientação é que quem fizer uso do remédio
mantenha o tratamento até avaliação com um médico para possível troca do
produto.
“A terapia da hipertensão é mais importante do que isso.
Se uma pessoa para de usar o medicamento, ela pode ter consequências sérias à saúde, até no mesmo dia”, afirma o gerente-geral de inspeção e fiscalização sanitária, Ronaldo Gomes.
As impurezas detectadas são as nitrosaminas, substâncias
encontradas em pequenas quantidades na água e em alguns alimentos, mas que, em
altos níveis e com consumo prologando, podem levar ao risco de câncer.
A suspeita de contaminação de insumos usados para fabricação
dos remédios foi detectada pela EMA (agência europeia de medicamentos) em julho
de 2018. De lá para cá, agências de diferentes países iniciaram inspeções.
Segundo a Anvisa, até o momento, não foram encontrados altos
níveis de nitrosaminas nos medicamentos usados no Brasil -daí considerar o
risco ao paciente como baixo.
“O paciente que ingerir o medicamento vai ter câncer? Não.
As chances são ínfimas”, afirma Gomes. “Essa impureza está presente em níveis
muito baixos.”
Pelos cálculos da agência europeia, o risco estaria presente
apenas em casos de ingestão, ao longo de cinco anos, de medicamentos com o
nível máximo de nitrosamina já descoberto até o momento.
Neste caso, o cálculo
seria de um caso extra de câncer a cada 6.000 pacientes. Para comparação, no
Brasil, a incidência atual de câncer é de 600 mil casos ao ano, ou um caso a
cada 333 brasileiros.
“Temos que lembrar que nem todos os lotes tinham essas
impurezas. Provavelmente essa exposição por cinco anos nunca aconteceu e não
vamos ter casos de câncer relacionados a isso. Mas temos que prevenir que essa
exposição que aconteça, daí as medidas”, afirma a gerente de fiscalização de
medicamentos, Andrea Geyer. Ela reforça que o risco de problemas à saúde é
maior pela interrupção brusca do uso dos medicamentos, cujo uso contínuo é
fundamental para o controle da hipertensão, do que pela suspeita de
contaminação dos produtos com as nitrosaminas.
E não há risco de tomar um medicamento com impurezas? “O
risco de tomar o medicamento por duas semanas adicionais é passível de ser
negligenciado. Até que consiga verificar com seu médico, o paciente pode
continuar ingerindo o medicamento, que continua a ser eficaz”, completa Gomes.
Neste caso, a recomendação é que o paciente verifique se o
lote do medicamento que utiliza está na lista dos que estão sendo recolhidos e
informe seu médico para substituição.
A agência informa ainda que a medida vale apenas alguns
lotes. Um remédio que estiver na lista, assim, pode ter lotes alvo de
recolhimento e outros que foram considerados adequados. Novas fiscalizações
estão sendo executadas.
E como assegurar que novos lotes de medicamentos a serem
produzidos não tenham essas impurezas?
Segundo a Anvisa, diversas ações estão sendo adotadas. Entre
elas, estão a suspensão da importação, comercialização e uso de insumos
farmacêuticos ativos de fabricantes com indícios e evidências de presença
dessas impurezas.
Ao todo, já foram suspensos três insumos (valsartana,
losartana e irbesartana) de dez fabricantes internacionais. “Também fizemos uma
medida que foi um programa de fiscalização específico de todas as empresas”,
diz Gomes.
Ele nega que tenha havido falha das fabricantes dos
remédios. “Foi algo imprevisto. O que se percebeu foi que, em determinadas
situações, pelo uso de solvente recuperado pelas fabricantes de insumos, esses
solventes poderiam ser contaminados por quantidade ínfima de uma substância que
na reação desses compostos gerariam a nitrosamina”, explica.
Agora, a agência finaliza uma proposta de resolução que
estabelece limites seguros para a presença de nitrosaminas, impõe novas medidas
de controle e dá prazo de dois anos para eliminação completa das impurezas. O
órgão justifica o prazo devido à necessidade de mudanças na produção. O mesmo período
foi adotado pela Europa.
Técnicos da agência afirmam ainda monitorar o risco de
desabastecimento dos produtos. Até o momento, isso não ocorreu e as chances são
vistas como baixas devido ao alto número de empresas produtoras. Diz ainda que
empresas fabricantes têm colaborado no processo de fiscalização -em alguns
casos, as empresas iniciaram o recall antecipadamente, informa.
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