A dona de casa Edinilza Marques da Silva, de 38 anos, não
escapou do surto de chikungunya que se instalou em Recife em outubro do ano
passado.
Foram cerca de oito dias calejados pelos sintomas da doença: febre,
dor intensa, fraqueza que a impedia de ficar em pé. Quinze dias depois, ela
precisou voltar ao posto de saúde. As pernas estavam inchadas e roxas na altura
dos tornozelo.
A dor a impedia de caminhar: Edinilza foi uma das pessoas
atendidas no Serviço de Cirurgia Vascular do Hospital das Clínicas da
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em Recife, que acaba de divulgar o
resultado de uma pesquisa mostrando pela primeira vez que a chikungunya pode
provocar doenças vasculares crônicas, como linfedemas (acúmulo de líquido
devido ao bloqueio do sistema linfático).
O mais importante desse estudo
é alertar os médicos para essa evolução da chikungunya, para que possam
diagnosticar e atuar mais rapidamente e, dessa forma, evitar
complicações", disse a cirurgiã vascular Catarina Almeida, de 35 anos, que
apresentou na última quarta-feira sua pesquisa à banca de mestrado no Departamento
de Cirurgia Vascular da UFPE. Na primeira fase da pesquisa (realizada de março
a junho de 2016), 32 pacientes, com idades entre 30 e 80 anos, se submeteram ao
exame de linfocitigrafia (que permite avaliar o funcionamento do sistema
linfático).
Desses, 86% apresentaram acometimento da circulação linfática
devido à chikungunya, com inchaço nas pernas. Noventa dias após a realização do
primeiro exame, na segunda etapa da pesquisa, 16 pacientes persistiram com o
inchaço. Vinte e nove pacientes voltaram a ser acompanhados, sendo que 20
repetiram a linfocitigrafia. Foi constatado que 65% deles tiveram piora em seu
quadro. "O estudo revelou que a chikungunya pode provocar doenças
vasculares crônicas, como linfedemas (acúmulo de líquido devido ao bloqueio do
sistema linfático)", concluiu Catarina, acrescentando que não há cura para
essas complicações. "Tratamos os sintomas com uso de meia elástica,
drenagem linfática e medicamentos para reduzir o inchaço".
Dona de casa
usa meia elástica para aliviar inchaço e dor nas pernas Para Edinilza, que
depende da rede pública para se tratar, restou a meia elástica. O que, segundo
ela, já proporcionou um grande alívio contra o inchaço e as dores que a
impossibilitavam de andar: "Não consegui fazer a drenagem linfática. Mas
uso diariamente a meia elástica até hoje. Se deixar de usar, o inchaço volta.
Ainda sinto dores. Essa doença deixa a gente velha precocemente e tenho dois
filhos para criar", disse a dona de casa, mãe de dois meninos, de 5 e 9
anos. Para o médico Júlio Cesar Peclat de Oliveira, diretor da Sociedade
Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular, ainda não é o caso de recomendar
o uso de meia de média compressão e drenagem linfática de forma preventiva para
todo paciente com chikungunya:
"Ainda estamos descobrindo essas
complicações causadas pela doença e por que elas acontecem. É fundamental
pesquisar para poder prevenir. Esse estudo de Pernambuco corrobora com nossa
impressão clínica. Temos visto esse quadro inflamatório vascular relacionados à
chikungunya nos serviços de angiologia e cirurgia vascular. Notamos que as
paredes dos vasos linfáticos inflamam e diminui a absorção dos líquidos que
ficam nos tecidos, provocando os edemas (inchaços). Tenho um paciente internado
com um quadro inicial de abscesso na perna. Precisamos drenar com procedimento
cirúrgico para evitar complicações", relatou Oliveira.
Segundo ele, a
melhor recomendação é procurar um serviço de cirurgia vascular ao primeiro
sinal de alteração nas pernas, como vermelhidão, calor, inchaço e dor. Já no caso
de acometimento das articulações após a fase aguda da doença, o paciente deve
procurar um reumatologista. Estudo realizado pela Uerj, com colaboração da UFRJ
e da Unirio, mostrou que isso pode acontecer em 30% dos casos de chikungunya.
A
pesquisa 'Complicações Vasculares na Febre Chikungunya' foi desenvolvida por
Catarina em conjunto com o chefe do Serviço de Cirurgia Vascular do HC, Esdras
Marques, a cirurgiã vascular Gabriela Buril, a chefe do Serviço de Medicina
Nuclear da unidade, Simone Brandão, e os especialistas em cardiologia Monica
Becker e Roberto Buril. *Voz da Bahia
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